O impacto da tecnologia de ponta na formação do médico do futuro

André Raeli

 

O conhecimento médico está avançando em uma velocidade singular. E não é de hoje: basta comparar os primeiros registros do ofício da medicina em civilizações pré-históricas e as modernas práticas da atualidade. 

Estudo da “American Clinical and Climatological Association” realizado em 2011 mostra que o domínio humano sobre esse entendimento prático da profissão avançou exponencialmente. Na década de 1950 do século XX, o tempo de duplicação do saber clínico foi de 50 anos; já em 1980, passou para 7; em 2010, 3,5 anos. Em 2020, a projeção foi de 0,2 anos, ou seja, apenas 73 dias. A incidência de novas patologias, o aumento da população e o avanço nas pesquisas podem ter contribuído para o novo cenário. 

No entanto, nada foi tão impactante nessa trajetória quanto a chegada das mais recentes tecnologias. Do diagnóstico aos processos cirúrgicos refinados, passando pelas mais robustas técnicas de tratamento e controle de doenças, todas as especialidades médicas sofreram o impacto da inovação,  sem, porém, abandonar a essência do cuidado tradicional. 

A inteligência artificial (IA) ou a Internet das Coisas (IoT), por exemplo, são empolgantes, mas não se pode perder de vista a importância da formação e da educação continuada. Cada vez mais novos profissionais precisam se preparar para esse novo horizonte tecnológico, com mais autonomia para a operação de novos sistemas e canais de suporte à decisão clínica. Em 2010, havia 320 mil médicos no Brasil; atualmente são mais de 550 mil em atuação. Portanto, existe um grande contingente que se formou em um paradigma de menos informação e conhecimento em relação à tecnologia aplicada.

Ainda que a natureza da profissão seja a busca ativa e constante por aperfeiçoamento e atualização, é preciso expandir o conhecimento em direção às novas tendências. Muito se fala do médico do futuro, das múltiplas habilidades e dos caminhos essenciais de formação, mas olhando apenas para os próximos anos. O futuro já chegou e capilarizar o conhecimento médico depende de uma mistura de fatores. É urgente falar sobre isso. É primordial manter uma escuta ativa com os médicos e prover novas formas de construir e disseminar o conhecimento.

Em trocas e diálogos contínuos com esses profissionais, é preciso valorizar o argumento do benefício de arquitetar um futuro para medicina, começando hoje. Tecnologias que podem ser ainda disruptivas para algumas áreas já fazem parte da rotina médica e  fazem a diferença em prognósticos e linhas de cuidado. As impressoras 3D para o auxílio em próteses, a ascensão do nicho de imaginologia e a oferta dos dispositivos de ultrassonografia móveis são alguns dos caminhos já bastante estabelecidos.

Na prática, as especializações médicas devem incorporar essa dinâmica de ampliação do conhecimento, de novas técnicas e plataformas, que não param de chegar. A telemedicina, autorizada em função do isolamento social na pandemia, é um exemplo de que as barreiras caíram e as oportunidades se tornam ilimitadas. É importante manter o radar ligado nos novos caminhos de aprendizado, visando sempre às melhores práticas para atender e proporcionar mais qualidade de vida.

É realmente difícil prever com exatidão o futuro, mas antevê-lo tem sido uma realidade frequente por meio da tecnologia. O preparo do médico do futuro não está no amanhã; ele começa agora, de forma muito intensa. O médico de 2040 irá olhar para o médico de hoje da mesma forma que é feito com o médico da idade média. O caminho para não ficar para trás é olhar para frente, compreendendo que há jornadas importantes já otimizadas pela tecnologia e que não irão sucumbir à magnitude do cuidar médico.  

André Raeli é diretor de educação continuada da Afya, maior ecossistema de educação e tecnologia voltada para a saúde no Brasil