Direção e ação: como preparar os municípios para enfrentar o coronavírus?

Helyn Thami, Arthur Aguillar, Isabel Opice, João Abreu, Larissa Leme, Vitor Silveira, Ana Claudia Costa, Daniela Krausz , Alexandre Lins e Marcelo Cabral 

 

Atingimos um estágio em que fazer o que está ao alcance imediato das mãos – ou não fazer nada – não é uma opção. O momento nos exige muito: lutamos contra um inimigo ainda desconhecido, contra o qual precisamos abrir alguma vantagem temporal. Em suma, precisamos comprar tempo e, exatamente por isso, temos que agir de modo proativo.

Para comprar esse tempo, o primeiro passo é o entendimento de que não há mais lugar pra ceticismo, em nenhum setor da sociedade e muito menos na gestão da saúde: a avalanche se aproxima enquanto olhamos para o topo da montanha. Não há lugar seguro e a Covid-19 chegará a todos os lugares. A calamidade é nacional.

Na luta contra o relógio, o esforço deve se concentrar em aumentar a capacidade de resposta dos municípios, e isso por duas razões. A primeira é que precisamos aumentar a nossa quantidade de leitos se quisermos fazer frente à pandemia, dar conta dos casos mais graves e evitar mortes. Já a segunda é que a preocupação deve ir além dos leitos, já que a maior parte da demanda (casos leves e moderados) será acolhida e manejada na assistência básica, sob responsabilidade direta dos 5.570 municípios, sejam eles grandes, médios ou pequenos.

Se você é um gestor da saúde municipal, provavelmente está sendo bombardeado com informações e exigências, o que pode tornar muito difícil a operacionalização de planos concretos de enfrentamento. Essa situação provavelmente ainda é agravada pela aparente falta de estrutura e recursos no município. É bom lembrar que são tempos que impõem dificuldades técnicas enormes, mas também desafiam o emocional e a resiliência.

Nesse sentido, a indústria de aviação tem algo a nos ensinar: checklists ajudam a prevenir erros em processos complexos. O Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), o Instituto Arapyaú e a Impulso somaram esforços para produzir um material para ajudar gestores municipais a diagnosticar suas redes, verificar onde é preciso concentrar esforços e entender o que é necessário fazer para conter o avanço da doença, de modo concreto e objetivo.

O documento abrange 4 dimensões, que explicamos a seguir:

  1. Gestão e governança: como organizar uma estrutura de tomada de decisão que permita a coordenação de medidas em tempo oportuno, com base no avanço da doença? Nessa seção, o documento aponta boas práticas para composição e operação dos gabinetes de crise/planos de contingência, para monitorar muito de perto o avanço dos casos, avançar nas medidas de distanciamento social e coordenar a organização da rede de atenção à saúde, incluindo os processos de regulação.
  2. Comunicação com a população: informação é crucial neste momento! Distanciamento social é uma medida de difícil manutenção, especialmente na cultura e realidade socioeconômica brasileira. Além disso, vivemos tempos em que ocorre a ampla divulgação de fake news. Nessa parte, o documento traça estratégias para informar a população, desmentir informações falsas e orientar sobre quais serviços procurar e quando procurar, evitando sobrecarga desnecessária e contágio dentro dos próprios serviços de saúde. É preciso evitar ruídos e adaptar as recomendações às realidades culturais e socieconômicas do território, de modo que não se pode subestimar o poder de uma linguagem simples e acessível.
  3. Vigilância em Saúde: mais do que nunca, é hora de criar inteligência a partir dos dados do SUS. Ao enfrentar o desconhecido, a análise de dados para subsidiar ações rápidas é essencial. O documento traz alguns requisitos que devem ser olhados e planejados com cautela pelas equipes técnicas de Vigilância, incluindo a ampla divulgação de materiais técnicos de orientação aos profissionais e o monitoramento dos processos de testagem e isolamento.
  4. Preparação da assistência em saúde: a ponta deve estar pronta e alinhada para a demanda que está por vir. O material apresenta alguns pilares básicos que merecem especial atenção dos gestores, incluindo a sinergia entre portas de entrada (UBS, pronto-atendimento, hospitais de emergência aberta), o redimensionamento de Recursos Humanos, o treinamento extensivo de equipes e o diagnóstico de capacidade instalada funcional e de estoque.

Além disso, o documento sugere um olhar cuidadoso para populações mais vulneráveis, seja em termos de condição de saúde ou em termos de condições sociais. Os gestores devem mapear áreas de moradias precárias e maiores concentrações de grupos de risco (como idosos e portadores de doenças crônicas) para priorizar e intensificar ações.

O documento na íntegra está disponível em https://coronacidades.org/. No site, há ferramentas e materiais de apoio técnico-institucional, inclusive canais de contato direto, em caso de dúvidas específicas. Acessem, divulguem e não deixem de entrar em contato com nossos times através dos canais disponibilizados. Sabemos que a implementação é sempre complexa e, por isso, nos colocamos à disposição para entender como podemos apoiar a esfera pública municipal nesse momento. Além disso, deem-nos feedback para orientar próximas ações.

Se nenhum vento serve a quem não sabe para onde navega, um norte para começar a estruturar essa luta é fundamental. Direção e ação podem – e devem – caminhar juntas.

São tempos difíceis que só poderão ser superados com esforço conjunto e resiliência. Desejamos a todos força e coragem. Responder à altura é possível! Vamos juntos!

 

Helyn Thami e Arthur Aguillar são pesquisadores do IEPS

Isabel Opice, João Abreu, Larissa Leme, Vitor Silveira, Ana Claudia Costa, Daniela Krausz e Alexandre Lins compõem a equipe de Direção e gestão local da Impulso

Marcelo Cabral é Gerente do programa Cidades e Territórios do Instituto Arapyaú