Por uma saúde pública de precisão

Manoel Barral Netto

Carlos Grabois Gadelha

 

O mundo passa por um profundo processo de mudança, caracterizando uma quarta revolução industrial, alterando padrões produtivos, tecnológicos e de geração de conhecimentos. Essas mudanças trazem consigo enormes desafios, tanto para a inserção dos países na nova configuração global do conhecimento quanto para as condições sociais da população referentes à equidade e ao acesso aos bens de natureza pública como a saúde.

 

A saúde constitui uma das áreas mais impactadas e promotoras das novas tecnologias. A experiência recente com a prevenção e o cuidado das epidemias de dengue, zika e chikungunya revelaram a vantagem da interação da atividade realizada em nível primário com aquelas relacionadas à geração de conhecimentos da evolução dos vírus, do perfil de saúde da população brasileira e do desenvolvimento de tecnologias de diagnóstico para a prevenção e análise precisa dos resultados.

 

Várias atividades experimentam alterações resultantes da grande disponibilidade de dados digitais e da elevada capacidade de seu processamento e análise. A Academia Brasileira de Ciências inclui o desafio do aproveitamento dos dados como um dos temas prioritários no campo da saúde. A Organização Mundial da Saúde incorporou a denominação de Saúde Digital para o campo que compreende diversas áreas como big data, modelagem, Saúde Móvel e as tecnologias de sensoriamento remoto.

 

O aumento exponencial na capacidade de processamento de dados permite análises complexas em grande velocidade, conferindo potencial para que a inteligência em saúde se constitua numa força para o acesso universal previsto em nossa Constituição. Uma das estratégias é a utilização das informações para aumentar a precisão das ações. A Saúde de Precisão visa a descoberta, validação e otimização de estratégias de cuidado para grupos bem definidos da população de forma rápida, segundo as necessidades de cada grupo populacional, independentemente de sua capacidade econômica de pagamento.

 

A caracterização da população segundo suas características genéticas, sociais e locais permite a adoção de medidas mais apropriadas para suas condições específicas, viabilizando a equidade e o acesso universal e integral com a adoção de práticas eficientes e melhores para as pessoas.

 

A Saúde de Precisão poderá ter impacto destacado nas inovações para o desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde no Brasil, cuja dependência de importações já atinge o arriscado valor de R$ 80 bilhões ao ano, possibilitando que deixemos de ser meros consumidores de pacotes tecnológicos gerados para populações diferentes da nossa. Precisamos desenvolver conhecimentos de que a sociedade precisa, visando atender às demandas do SUS de modo racional e economicamente sustentável.


A linearidade do cuidado, tratada de modo errôneo como equidade, é ineficiente e carrega em si uma diferenciação inaceitável para o cuidado eficiente e racional das pessoas. A Saúde Pública de Precisão permite avançar no contexto contemporâneo dos novos conhecimentos e tecnologias numa perspectiva de garantir a sustentabilidade do SUS frente ao compromisso com a equidade em saúde em todas as suas dimensões.

 

Manoel Barral Netto e Carlos Grabois Gadelha são pesquisadores da Fiocruz.