A saúde do Brasil em debate

Miguel Lago
Arthur Aguillar

A América Latina é o continente mais violento do mundo: a região experimenta uma epidemia de homicídios e inúmeros problemas institucionais, políticos e econômicos. Nesse sentido, não é de se admirar que no Latinobarômetro de 2018 –pesquisa anual realizada anualmente em 18 países da região–, os latino-americanos apontaram como principais problemas em seus países o desemprego e a delinquência. A única exceção é o Brasil, onde a maior preocupação é a saúde, mencionada por 1 em cada 5 brasileiros como o maior problema nacional. A pesquisa também mostra que os brasileiros estão insatisfeitos com a qualidade dos serviços de saúde: apenas 16% da população se diz satisfeita com a qualidade dos hospitais.

Nos últimos 30 anos, o Brasil tem avançado na implementação e consolidação de um sistema universal de saúde. O país é o único no mundo com mais de 100 milhões de habitantes a ter um sistema desse tipo. Os avanços do SUS são extraordinários, tanto em termos de aumento de cobertura, como nos resultados de saúde da população. Desde o início dos anos 1990, observam-se no país, objetivamente, avanços significativos: a expectativa de vida subiu de 65 anos em 1990 para 75 anos em 2015; a mortalidade infantil, até 1 ano, diminuiu de 53,4 para 14 por mil nascidos; a cobertura de vacinação de pólio subiu de 58% para 98%; de 1998 a 2013, mais de 95% dos brasileiros que buscaram o SUS conseguiram ser atendidos.

Como é possível persistir uma avaliação tão negativa, em uma área onde se avançou tanto? Como então melhorar a saúde da população? Que saúde queremos ter? Que saúde podemos ter? Como aprimorar o nosso sistema? Como garantir equidade, e que a saúde brasileira não seja um vetor de aprofundamento das desigualdades? São todas questões prementes que devem ser objeto de um debate aberto, informado e qualificado. Um debate que hoje se restringe aos especialistas da área. À diferença de outras áreas, como educação, segurança pública e meio-ambiente, a saúde está sub-representada na opinião pública.

E os desafios e as escolhas sociais são inúmeros e é preciso discuti-los. O Brasil caracteriza-se pela chamada tripla carga de doenças. Experimentamos ao mesmo tempo problemas de saúde de países pobres –doenças infecciosas–, de países ricos –com o envelhecimento da população e o aumento da incidência de doenças crônicas–, além das altas taxas de homicídios e de mortes no trânsito. Do lado da provisão de serviços, nosso sistema de saúde se organiza em três níveis de governo e precisa responder aos desafios de uma sociedade complexa e heterogênea; um sistema de saúde onde o público e o privado se misturam e se influenciam, às vezes se complementando, às vezes competindo. Diante desses desafios, nem sempre as respostas serão simples ou consensuais. Portanto, a discussão e o debate público são condições necessárias para entendermos quais as nossas possibilidades e perspectivas.

As vozes da saúde também são múltiplas e todas elas têm a contribuir para o debate sobre qual saúde queremos para o Brasil: do lado da oferta, os profissionais da medicina, da enfermagem, da farmácia, os gestores de saúde, executivos da saúde e agentes de saúde. Tão importantes quanto são as vozes do restante da sociedade: dos pacientes, dos consumidores de planos de saúde, dos ativistas, acadêmicos e todos aqueles que se relacionam diretamente com o sistema.

O Saúde em Público será um espaço dedicado a essas vozes: funcionará como uma tribuna livre que discutirá experiências de sucesso, caminhos possíveis e trará dados para embasar uma ampla discussão sobre as políticas de saúde. O espaço será curado e editado pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), uma organização sem fins lucrativos, independente e apartidária, cujo objetivo é contribuir para o aprimoramento das políticas públicas do setor de saúde no Brasil. Para mais informações sobre o IEPS, acesse o site ieps.org.br.